Na minha prática de Terapia de Casal, uma das queixas mais recorrentes é a falta de intimidade. Os membros do casal afastam-se, deixam de se sentir conectados, agem como companheiros de casa, sem cumplicidade, sem apoio emocional, sem cuidar ou escutar as necessidades do outro.
Nesta fase é comum os casais começarem a sentir que a relação não tem saída, que o amor acabou, que merecem ser felizes e que a separação pode ser a solução que ambos precisam.
A separação pode ser uma solução, mas deixem-me avisar que não é uma solução pacífica ou isenta de sofrimento. De facto, quando os cientistas examinam as ressonâncias magnéticas funcionais dos cérebros de pessoas que acabaram de passar por um divórcio ou uma separação, verificam que as regiões cerebrais que se iluminam são exatamente as mesmas que se iluminam no cérebro de pessoas que estão a sentir dor física. Isto acontece para a rejeição, mas não acontece o mesmo para emoções negativas, como a tristeza, a ansiedade e o medo. Apenas para a rejeição, a rejeição é única. A rejeição dói.
Não me canso de repetir; como seres humanos, estamos programados para a conexão. As pesquisas inovadoras em neurociência mostram que a nossa necessidade de nos conectarmos com um outro significativo é tão fundamental e básica como a nossa necessidade de comida e de abrigo. De tal forma que, quando desconectamos, sofremos tanto como se tivéssemos uma dor física.
Quando uma pessoa tenta aproximar-se da outra e é rejeitada, sente que a outra não está lá para ela, pensa que já não é atraente, que já não é amada, que a outra pessoa já não quer estar com ela e este é o sentimento mais solitário do mundo.
A pessoa que rejeita está focada apenas nela, não pensa naquilo que a sua rejeição provoca no outro, só pensa que está de mau humor, não está com vontade, está preocupada com outros assuntos, está com dor de cabeça…não entra em empatia com o seu par para compreender a sua dor e a sua solidão.
Sendo que a redução da libido afeta homens e mulheres, a falta de desejo espontâneo para envolver-se em atividade sexual é frequentemente referida pelas mulheres. Embora muitas mulheres possam sentir desejo e interesse espontâneos enquanto estão num novo relacionamento sexual, ou após uma longa separação de um parceiro, a maioria das mulheres em relacionamentos de longo prazo não pensa com frequência em sexo e não sente necessidade espontânea de atividade sexual.
O discurso é mais ou menos assim:
- Querida, vamos pôr as crianças na cama cedo, tomar um copo de vinho e namorar?
- Tenho tantas coisas na cabeça, estou stressada e com dor de cabeça.
- Ainda a semana passada disseste que as mulheres são ótimas em multitarefas, não podes ter dor de cabeça e sexo ao mesmo tempo?
- Não tens graça nenhuma! Que parte do 'não' é que não entendes?
- Não estou a tentar ser engraçado. Estou furioso. Não fazemos sexo há seis semanas. Eu odeio esse relacionamento. Simplesmente não está a funcionar.
- Tu levantas a sua voz e falas assim comigo, e depois esperas que eu te queira tocar?! Nas últimas semanas nem paraste em casa! E quando estás, não falas comigo, não fazemos coisas juntos, estás sempre a criticar o que faço e o que eu digo… só te aproximas quando queres sexo. Eu não vou fazer sexo assim.
- Eu não te posso ouvir mais. Vou dar uma volta.
Nos estágios iniciais de uma relação sem intimidade, a pessoa com maior desejo geralmente aborda o seu cônjuge com franqueza e vulnerabilidade, mas quando os pedidos de conexão são recebidos com indiferença ou rejeitados, a pessoa sente-se não desejada, não apoiada e abandonada, a vulnerabilidade é rapidamente transformada em raiva e desprezo. A raiva e o desprezo levam a discussões e ao distanciamento, incluindo a abstinência sexual, para evitar a dor da rejeição. O distanciamento leva o outro também a sentir-se não desejado, não apoiado e abandonado. É um ciclo negativo em que ambas as partes se afastam e esperam que a outra pessoa mude.
A pior coisa para uma relação é afastamento de ambas as partes.
Então o que é que devem fazer?
Ele precisa de regular a sua raiva e de passar mais tempo com ela, conversar com ela, estar presente na vida dela. Precisa de a escutar, de perguntar sobre as suas emoções e necessidades, elogiá-la, fazer coisas por ela, surpreendê-la, mostrar que gosta dela, abraçá-la, beijá-la. Pode até entrar em jogos de sedução, dizer-lhe que ela o excita, tocar-lhe com afeto em locais mais íntimos, dizer-lhe algo sensual, deixar-lhe mensagens eróticas, sugerir algumas fantasias… Ele deve reconhecer que ela precisa de ser estimulada afetiva e sensualmente, ela precisa de sentir a confiança de que é desejada e amada.
E o que ela precisa fazer? Bem, apesar de poder não sentir desejo inicialmente, ela precisa de se deixar levar porque quando ela se deixa envolver, ela aprecia, diverte-se e reconecta-se. E quando se reconectam acabam por quebrar o ciclo do afastamento e a relação verdadeiramente muda. Ele ficará mais feliz, mais amável, mais presente e mais aberto à vulnerabilidade. O padrão transforma-se num ciclo positivo.
Você pode estar a ler isto e a pensar que é uma ideia bastante machista! Contudo a ciência fundamenta esta abordagem.
Tradicionalmente, o modelo linear de resposta sexual, preconizado por Masters e Johnson, descreve o ciclo de resposta sexual humana numa sequência invariável de 4 fases. A primeira é o desejo. Isso significa que você pode estar a fazer praticamente qualquer coisa, e de repente, tem este pensamento libidinoso e começa a fantasiar sobre sexo. A segunda fase é a excitação. Você fica fisicamente excitado/a, os seus genitais lubrificam-se e preparam-se para o sexo. A terceira etapa é o orgasmo e a quarta é a resolução, ou seja, o seu corpo volta ao estado normal de repouso. Neste modelo, não há diferenciação entre a sexualidade masculina e a feminina.
Porém, as evidências clínicas têm demonstrado que, especialmente para as mulheres, há aspetos mais subjetivos, ligados a condições psicossociais, culturais e relacionais, que têm grande importância para a compreensão da sexualidade feminina. Em 2000, Rosemary Basson, psiquiatra canadense, pesquisadora do Centro de Sexualidade da British Columbia University, apresentou um novo modelo de funcionamento da sexualidade que sugere que os estádios um e dois, o desejo e a excitação, na verdade, podem ser revertidos. O corpo pode ser estimulado fisicamente para que o cérebro registe o desejo.
No início de um relacionamento, a resposta sexual feminina segue o ciclo de desejo, excitação, orgasmo e resolução, tal como descrito pelo modelo tradicional do ciclo da resposta sexual humana. Mas num relacionamento a longo prazo, as razões da mulher para iniciar ou aceitar sexo incluem as necessidades de intimidade e de carinho, o desejo por maior proximidade e envolvimento, de agradar ao parceiro, de expressar amor ou de aumentar o próprio bem-estar e não incluem tanto a necessidade física de excitação sexual. Mais do que um impulso biológico, este modelo indica o desejo de intimidade como motivação para a atividade sexual.
Basson sugere que o desejo de maior proximidade e intimidade emocional pode predispor a mulher a participar em atividades sexuais. A partir deste ponto de neutralidade sexual - onde uma mulher é recetiva a ser sexual, mas não inicia a atividade sexual - o desejo de intimidade leva-a a buscar maneiras de se tornar sexualmente excitada por meio de conversas, música, leitura ou visualização de materiais eróticos ou estimulação direta. Uma vez que ela está excitada, o desejo sexual surge e motiva-a a continuar a atividade.
O desejo das mulheres, especialmente em relacionamentos mais longos, tende a ser mais responsivo do que espontâneo, o que significa que você pode não sentir desejo de iniciar, mas uma vez que você começa a interagir com seu parceiro, o desejo vem como uma resposta a essa interação. É claro que isso depende do sentimento de que seu relacionamento é satisfatório e seguro. Sem um relacionamento "suficientemente bom", você provavelmente não terá a disposição para aderir a qualquer encontro sexual.
Então o que devemos fazer?
1. Todos nós temos diferentes maneiras de nos sentirmos conectados uns aos outros. O desejo sexual nem sempre tem que vir antes da atividade ou excitação sexual. Às vezes experimentar a excitação despertará o desejo.
2. Precisamos saber o que é importante para nós e ser capaz de o pedir.
3. Temos de ser especialistas na maneira como o/a nosso/a parceiro/a se sente conectado a nós e dar resposta às necessidades dele/a.
4. Se você está com alguém que anseia por mais toque, mais proximidade física e mais sexo, não se iluda pensando, "é apenas sexo!". Sexo é uma forma poderosa de conexão e de criar laços com alguém que se ama.
5. Cuidar das necessidades do nosso parceiro é um ato de amor.
Então, quando o seu par lhe diz: "Podemos desligar os nossos telefones para podermos passar algum tempo juntos sem interrupções? " ou "Há muito tempo que não fazemos amor”, ou “Apetece-me aconchegar na cama e fazer amor contigo" se não estiver com vontade, lembre-se que a rejeição magoa. Lembre-se também que para evitar tal dor é possível que o seu par se distancie. Ao contrário, relacionamentos saudáveis são baseados no cuidado mútuo.
O modelo de Basson esclarece ainda que o objetivo da atividade sexual para as mulheres não é necessariamente o orgasmo, mas sim a satisfação pessoal, que se pode manifestar como satisfação física (orgasmo) e/ou satisfação emocional (sensação de intimidade e conexão com um parceiro). A essência da satisfação é que você se sente bem consigo mesma como um ser sexual e que se sente energizada numa relação que vive plenamente a sua intimidade.
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